Objeção 1: Parece não ser muito adequada para o batismo a tradicional forma das palavras: “Eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”, pois a ação precisa ser designada ao agente principal em vez do ministro. O ministro do Sacramento atua como um instrumento como afirmado acima (perg. 64, art. 1), enquanto o principal agente do Batismo é Cristo, de acordo com João 1,33, “Ele, sobre o Qual, vós vistes o Espírito descer e permanecer sobre Ele, Ele é quem batiza”. Assim sendo, não parece bem ao ministro “Eu te batizo…”, além do fato de que, na versão latina, a palavra “Ego” (eu) já está contida na palavra “baptizo”[*]; então, dizer “Eu te batizo…”, seria redundância.
Objeção 2: Também, não é necessário para as pessoas que praticam uma ação, fazer menção da ação feita; assim, aquele que ensina algo não precisa dizer “Eu ensino a vocês…”. Então, nosso Senhor deu ao mesmo tempo os preceitos, tanto do batismo como do ensinamento, quando Ele disse (Mt 28,19): “Vão, ensinem (o evangelho) a todas as nações…”. Assim sendo, não é necessário mencionar a ação do batismo (enquanto estiver batizando).
Objeção 3: Muitas vezes a pessoa batizada não entende as palavras; por exemplo, se ela é surda ou criança, é desnecessário discursar a cada uma. De acordo com Síraco 32,6: “Quando não há ouvintes, não desperdices palavras”. Assim sendo, é desnecessário dizer à pessoa batizada as palavras “Eu te batizo…”
Objeção 4: Além disso, pode acontecer de várias pessoas serem batizadas por vários ministros ao mesmo tempo; desta maneira, os apóstolos batizaram três mil em um dia e, noutro dia, mais cinco mil (At 2,4). Portanto, a forma de Batismo não pode ser limitada a um número único na forma das palavras, “eu te batizo”, mas deve possibilitar dizer “nós vos batizamos”.
Objeção 5: Além disso, o Batismo deriva seu poder da Paixão de Cristo. Mas o Batismo é santificado pela forma. Assim, parece que a Paixão de Cristo deveria ser mencionada na forma do Batismo.
Objeção 6: Além disso, um nome significa a propriedade de algo. Mas existem três Propriedades Pessoais das Pessoas Divinas, como foi declarado no Livro I, Questão 32, Artigo 3. Portanto não podemos dizer “em nome do” mas “nos nomes do Pai e do Filho e do Espírito Santo”.
Objeção 7: Além disso, a Pessoa do Pai é designada não apenas pelo nome de Pai, mas também por “Não Criado e Criador”; e o Filho é designado por “Verbo”, “Imagem” e “Gerado”; e o Espírito Santo é designado por “Dom”, “Amor” e “Procedente de Um”. Assim, parece que o Batismo é válido se for conferido nesses nomes. Pelo contrário, nosso Senhor disse (Mt 28,19): “Ide… ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo.” Eu respondo que o Batismo recebe sua consagração desta fórmula, de acordo com Ef 5,26: “purificados com o banho da água e santificados pela Palavra”. E Agostinho disse (De Unico Baptismo IV) que “o Batismo é consagrado pelas palavras do Evangelho”. Consequentemente, a causa do Batismo precisa ser expressada na forma batismal. Agora, esta causa é composta de duas formas: a causa principal da qual deriva sua virtude, e esta é a Santíssima Trindade; e a causa instrumental, que é o ministro que confere o sacramento exterior. Assim, ambas as causas devem ser expressas na forma do Batismo. Logo, o ministro é designado pelas palavras: “Eu te batizo” e a causa principal encontra-se nas palavras: “em nome do Pai e do Filho e Espírito Santo”. Portanto, esta é forma adequada do Batismo: “Eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”.
Resposta à Objeção 1: A ação é atribuída a um instrumento como para o agente imediato mas, para o agente principal, na medida em que o instrumento age em virtude disto. Conseqüentemente é isso que se ajusta na forma batismal que o ministro deve mencionar para realizar o ato de batizar, nas palavras: “eu te batizo”. De fato, nosso Senhor atribuiu aos ministros o ato de batizar, quando disse: “Batizai-os” etc. Mas a causa principal é indicada como conferir o sacramento por Seu próprio poder, nas palavras: “em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”; para Cristo, não é possível batizar sem o Pai e o Espírito Santo.
Os gregos, entretanto, não atribuem o ato de batizar ao ministro, para evitar o erro daqueles que, no passado, relacionavam o poder batismal aos batizantes, dizendo (1Cor 1,12): “Eu sou de Paulo… e eu de Cefas”. Por esse motivos eles usam a forma: “Que o servo de Cristo, (nome), seja batizado em nome do Pai” etc. E já que a ação realizada pelo ministro é expressada com a invocação do Trindade, o sacramento é validamente conferido. Quanto à adição do “Ego” (=eu) em nossa forma, ela não é essencial, mas é adicionada para aumentar a ênfase sobre a intenção.
Resposta à Objeção 2: Já que um homem pode ser lavado com água por diversas razões, o objetivo para isto deve ser expresso através das palavras da forma. E isto não é feito ao se dizer: “em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”, pois estamos limitados a fazer todas as coisas sob aquele Nome (Col 3,17). Logo, a não ser que o ato de batismo seja expreesso – seja da forma como fazemos ou como os gregos fazem – o sacramento não é válido. Isto está de acordo com o decreto de Alexandre III: “Se alguém mergulhar uma criança três vezes na água em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, Amém, sem dizer: ‘Eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém’, tal criança não foi batizada”.
Resposta à Objeção 3: As palavras que são expressas nas formas sacramentais são ditas não meramente para o propósito de significação, mas também para o propósito de eficiência, na medida em que elas derivam sua eficácia do Verbo, daquele por quem “todas as coisas foram feitas”. Consequentemente, elas são convenientemente endereçadas não apenas para os homens, mas também para as criaturas insensíveis, como por exemplo, quando dizemos: “Eu te exorcizo, criatura” (no ritual romano).
Resposta à Objeção 4: Várias pessoas em conjunto não têm como batizar uma outra, ao mesmo tempo, já que a ação é multiplicada de acordo como o número de agentes, não podendo ser perfeitamente praticada por cada um deles. Então, se duas pessoas vierem a se combinar, e uma delas permanecer muda, sendo incapaz de expressar as palavras, e a outra estiver sem mãos e for incapaz de executar a ação, elas, mesmo em conjunto, não poderão batizar ao mesmo tempo, ainda que um profira as palavras e a outra execute a ação.
Por outro lado, em caso de necessidade, é possível se batizar várias pessoas ao mesmo tempo. mesmo assim, nenhum deles receberá mais do que um só batismo. Mas será necessário, nesse caso, dizer: “Eu vos batizo”. Isto não é uma alteração na forma, pois “vos” é o mesmo que “te e te”. Porém, “nós” não significa “eu e eu”, mas “eu e tu”; aqui sim, representaria uma mudança na forma.
Da mesma forma, seria mudança na forma dizer: “Eu me batizo”; consequentemente, ninguém pode batizar-se a si mesmo. Por essa razão Cristo quis ser batizado por João (Extra, De Baptismo et ejus effectu, cap. Debitum).
Resposta à Objeção 5: Embora a Paixão de Cristo seja a causa principal se comparada com o ministro, ainda assim é uma causa instrumental que é comparada à Santíssima Trindade. Por esse motivo, a Trindade é mencionada ao invés da Paixão de Cristo.
Resposta à Objeção 6: Ainda que exita três nomes pessoais para as Três Pessoas, não existe mais que um nome essencial. O poder divino que opera no Batismo pertence à Essência. É por isso então que dizemos “em nome” em não “nos nomes”.
Resposta à Objeção 7: Da mesma forma que a água é usada no Batismo, já que ela é mais comumente empregada para o banho, então, para o propósito de designar as Três Pessoas na forma do Batismo, estes nomes [Pai, Filho e Espírito Santo] são escolhidos, pois são geralmente usados em uma linguagem particular para significar as Pessoas. O sacramento não é válido se for conferido sob quaisquer outros nomes.
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NOTA
[*] Baptizo – na forma latina não se diz “Ego baptizo”, mas apenas “baptizo”, pois o pronome já fica implícito no verbo. O pronome apenas é utilizado quando se quer enfatizar bastante o sujeito, como quando Cristo diz “Ego sum alfa et omega” (Eu sou o alfa e o omega – o começo e o fim); então o pronome é utilizado para enfatizar que Ele, e apenas Ele é o começo e o fim. (N.doT.)
- Autor: São Tomás de Aquino
- Fonte: Suma Teológica, Parte III, Questão 66
- Tradução: Dercio Antonio Paganini
Fernando Vanini de Maria