DIFICULDADES CONEXAS À APOSTOLICIDADE DA IGREJA

 





Dificuldades conexas à Apostolicidade da Igreja:
Mas, em conexão com a apostolicidade da Igreja, podem surgir duas graves dificuldades, que não temos o direito de deixar de lado nesta nossa instrução. Ambas podem causar perturbação nas almas, é melhor encará-las de frente.
A) Se a Igreja remonta inteiramente à época longínqua dos apóstolos, não têm então razão os que acusam a Igreja de ser demasiado antiga, atrasada, ultraconservadora, de não saber compreender a vida humana atual, de não estar adaptada aos tempos modernos? A Igreja não é demasiado antiga, e incapaz de resolver os problemas dos tempos modernos?
A nossa resposta será que a verdadeira religião de Cristo deve ser velha e moça ao mesmo tempo.
a) Cumpre que a verdadeira Igreja de Cristo seja velha.
As antigas casas de comércio inscrevem ufanamente na sua porta de entrada a data da sua criação. “Fundada em 1.900”, lê-se às vezes na tabuleta. E as pessoas dizem consigo: “Esta casa existe há 39 anos, pode-se comprar nela com confiança”. Sabeis, porém, o que é que está inscrito à entrada da Igreja Católica? “Fundada no ano 33”. Ela existe, pois, há 1.906 anos; existe desde a época de Nosso Senhor Jesus Cristo; pode-se, pois, ter confiança nela.
b) Mas, por outro lado, cumpre também que a Igreja de Cristo seja jovem, duma juventude cheia de força, pois Cristo prometeu que sua Igreja existiria até o fim do mundo (Mt 28, 20). E justamente porque Cristo eterno vive na Igreja, a velhice da Igreja não significa falta de força, e a apostolicidade da Igreja não significa fraqueza.
É a verdade que a árvore da Igreja, velha de 1.906 anos, é cheia de vida, e que a Igreja se interessa pelas questões angustiosas dos problemas mais modernos, coisa de que poderíamos citar aqui uma multidão de exemplos, se fosse necessário.
Citaríamos as mais recentes encíclicas pontifícias, nas quais a Igreja projeta a luz eterna do Evangelho sobre os problemas morais e sociais mais novos; e não somente ela toma posição nas questões mais modernas, mas fá-lo com uma ousadia e uma decisão que não podem brotar senão da plena convicção da sua força invencível.
A Igreja sabe que, no decurso de 19 séculos, tem sustentado vitoriosamente todos os assaltos possíveis, e esta convicção dá-lhe essa tranquilidade superior que ela manifesta mesmo nas situações mais críticas e que nos faz sentir o sopro sereno da eternidade, que paira acima dos anos. Sim, a Igreja é conservadora nos limites necessários, mas, em compensação marcha também com o progresso onde quer que seja possível. Os missionários não chegam mais às terras longínquas em naus à vela, mas em vapores ou em aviões. O papa serve-se do rádio para transmitir suas instruções às nunciaturas em todos os cantos do mundo. E os sermões, em vez de se dirigirem unicamente à assistência, são transmitidos, pelo rádio, a centenas de milhares de ouvintes distantes.
Quantas ordens religiosas novas vemos em formação, as quais têm em conta as necessidades espirituais modernas! Assim, por exemplo, foi fundada, não faz muito tempo, em Viena, uma congregação completamente nova, a “Congregação das Vítimas de Jesus”, a qual não possui convento particular, mas cujas religiosas habitam, em pequenos grupos nas casas baratas da cidade, nas vilas operarias, em barracas, no meio dos operários afastados da religião e aí cuidam das crianças e dos pobres, dirigem para o céu os olhos dos homens mergulhados na maior miséria.
Em verdade, se bem que a Igreja remonte ao tempo dos apóstolos e já velha, não é antiquada; se bem que apostólica, não está caduca. Pode-se, porem, relativamente á apostolicidade da Igreja levantar ainda uma dificuldade mais importante, que também queremos encarar aqui. Quantas vezes os ignorantes nos fazem a censura de que a religião católica atual não é mais a que era no tempo de Nosso Senhor Jesus Cristo!
“Cristo não conheceu essa imensa hierarquia que está agora implantada no mundo inteiro: os cardeais, os arcebispos, os bispos, os padres, os religiosos, as religiosas não existiam na época de Cristo. E as numerosas festas, as relíquias, as peregrinações, as ladainhas, as cerimônias… tudo isso não existia na época de Cristo. Como então a Igreja Católica pode dizer que é apostólica?”
Quantas vezes ouvimos essa censura, – e que lhe respondemos?
a) Naturalmente devemos reconhecer o que há de verdade nessa objeção. É verdade que na nossa Igreja podemos achar hoje em dia muitas cerimônias, disposições disciplinares, e instituições, que realmente não existiam no tempo de Cristo, mas que são o resultado duma evolução. Com efeito, – e é este o ponto capital na questão, – todas essas coisas não são uma construção artificial, mas uma evolução natural. Um desenvolvimento natural do grão de mostarda que Cristo semeou e que cresce e se desenvolve nos diferentes países, e entre os povos mais diversos em meio às circunstâncias culturais e políticas mais variadas, e se adapta a elas. Ela não cede nada da sua essência, mas adapta-se ás coisas exteriores. E o que mostra a sua força vital é ser ela capaz, em qualquer época, de satisfazer as necessidades espirituais mutáveis de todas as nações, sem ser obrigada a renegar o que quer que seja da sua essência própria.
b) A Igreja tem, pois, mudado em muita coisa – dizem alguns.
Mudado? Dizei somente em que foi que ela mudou? Em muita coisa. Nos ritos, nos costumes, nas leis. O Jejum atual é diferente do que era outrora, as festas também são diferentes.Tudo isso é verdade. Mas é o mero invólucro da religião. Acaso mudais, quando trocais de roupa?
c) Mas há também mudanças na doutrina, e não somente no aspecto exterior, dir-se-ia talvez. O Símbolo dos Apóstolos era mais curto outrora do que hoje. Foi mais tarde que o alongaram. E mesmo aquele que o padre diz na missa é bem mais comprido do que o recitado pelos fiéis. Há mesmo o que chama a profissão de fé do Concílio de Trento, e que é pelo menos, cinco vezes mais longa do que o Símbolo dos Apóstolos.
É assim que argumentam alguns. E tudo isso também é verdade. E, no entanto, daí não resulta alteração nem modificação alguma.
Que houve então? Houve que primitivamente só existia o símbolo mais curto, que agora chamamos “símbolo dos apóstolos”. Mas depois apareceram hereges cujos erros obrigaram a Igreja a insistir mais em um ou outro dogma, e a alongar o primeiro símbolo, que era mais curto. Esses acréscimos versaram justamente sobre os pontos atacados pelos hereges.
A Igreja, assim, fortificou e estendeu o Símbolo no curso das idades, nos pontos onde os hereges a atacavam.
d) Mas, contudo, hoje temos mais dogmas do que dantes – insistem outros. Na realidade, eles são a eflorescência da fé cristã primitiva, tal como a flor é a eflorescência do botão da árvore.
Quando um homem de 40 anos olha uma fotografia da usa infância, junta as mãos com admiração: Sou mesmo eu? Na realidade, é ele mesmo, tal qual era antes. O exterior, os traços, os cabelos, a roupa são diferentes de há 40 anos, mas as partes essenciais são as mesmas: o coração é o mesmo, um pouco maior; os pulmões, os olhos, a boca, o cérebro são os mesmos, apenas se desenvolveram completamente.
O mesmo sucede com a nossa Igreja, idosa de 1.906 anos. Há 19 séculos ela se compunha apenas de duzentos ou trezentos homens; hoje, tem 360 milhões. É, pois, natural que a Igreja, que cresceu imensamente, seja hoje, no exterior, nas vestes, nas festas, nos ritos, nas práticas de devoção e numa multidão de coisas, diferente da Igreja dos apóstolos, que não contava mais do que algumas centenas de fiéis; mas ficou sendo a mesma na sua substância: ela está edificada na mesma pedra que outrora, tem a mesma fé que então; tem os mesmos sacramentos. E é o que nós proclamamos quando dizemos: “Cremos na apostolicidade da Igreja”.
***
Meus irmãos, um dia no parlamento inglês um adversário político apostrofou Daniel O’Connel, o grande homem de Estado irlandês: “Papista!”
O herói da liberdade da Irlanda respondeu incontinente:
“Julga v. ex. haver-me ofendido chamando-me papista, e não sabe quanto me honrou. Efetivamente, sou papista, e folgo de sê-lo: porque esse termo ‘papista’ significa para mim que a minha religião remonta, pela cadeia ininterrupta dos papas de Roma, até Jesus Cristo, ao passo que a fé de v. ex. não vai mais longe do que a Henrique VIII e Isabel”.
Em verdade, irmãos, se sou católico, tenho 19 séculos. Se sou católico, conservo-me sobre o rochedo de Pedro. Se sou católico, estou seguro na minha fé. Se sou católico, posso repetir com ufana alegria, as magnificas palavras pronunciadas, não há muito, num congresso católico pelo conde Alberto Apponvi, e que foram reproduzidas na sua notícia fúnebre: “Sinto que, pela graça de Deus, habito num fortaleza de que como portas do inferno jamais alcançadas triunfar; sinto a proximidade da fonte inexaurível das graças que elevam a fraqueza humana, que a auxiliam nos combates da vida, e suprem a insuficiência das condições humanas; quando tudo vacila em torno de mim, sinto um terreno firme debaixo dos pés; quando tudo parece cair nas trevas, sinto brilharem sobre nós os raios da verdade eterna; ouço, em meio ao ruído das opiniões passageiras,
Senhor, agradeço-Vos por poder ser membro da Vossa Igreja una, santa, católica e apostólica. Amém.
(Toth, Mons. Tihamer. A Igreja Católica. Rio de Janeiro: José Olympio, 1942, p. 57-70)


Fernando Vanini de Maria.

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