SERÁ QUE PARA O BATISMO HÁ A NECESSIDADE DE ÁGUA PURA E CRISTALINA??


 Objeção 1: Parece que não é estritamente necessária a água pura e cristalina para o Batismo, pois a água que temos jamais será uma água pura como parece, principalmente na água dos mares e rios, nas quais existe uma considerável quantidade de elementos estranhos, como demonstra o Filósofo (Meteor.II). Assim sendo, não é possível realizar um Batismo normal com água pura.

Objeção 2: Além do mais, nas solenes celebrações do Batismo, o servo é mergulhado na água e isso causa a perda da pureza e da cristalinidade da água; assim sendo, a água pura e cristalina não é necessária ao Batismo.

Objeção 3: Também a água que correu do lado de Cristo quando pendurado na cruz, tomada como uma figura do Batismo, conforme estabelecido anteriormente (3 ad 3), aparentemente também não era uma água pura e cristalina, pois era proveniente do corpo de Cristo, onde haviam vários elementos misturados; assim sendo, a água pura e cristalina não é necessária ao Batismo.

Objeção 4: Também, a solução esterilizante não parece ser água pura, pois ela tem propriedades de aquecimento e secura, que é contrária àquelas da água; todavia parece que uma solução esterilizante pode ser usada no Batismo; para a água de banho pode também ser usada, a qual foi filtrada através de um canal sulfuroso, assim como a solução esterilizante é filtrada através de cinzas; assim sendo, a água pura e calma não é necessária ao Batismo.

Objeção 5: Também a água-de-rosas é destilada das rosas, assim como águas químicas são destiladas de certos corpos. Mas semelhantemente, estas “quase águas” podem ser utilizadas no Batismo, assim como água de chuva destilada por evaporação; e sendo assim, estas águas não são águas puras e cristalinas; portanto, a água pura e cristalina não é necessária ao Batismo.

Pelo contrário, a própria matéria do Batismo é a água, como definido anteriormente (art. 3), mas somente a água pura e cristalina tem a natureza de água. Então, água pura e tranqüila é necessária ao Batismo.

Eu respondo que: a água pode deixar de ser pura ou cristalina de duas formas: primeiro, quando é misturada a um outro corpo; e, segundo, por alteração. E cada uma dessas formas pode ocorrer de duplo modo: artificialmente e naturalmente. Porém a arte falha em comparação com natureza porque a natureza dá uma forma substancial que a arte não pode dar, pois enquanto a forma dada pela arte é acidental, exceto por acaso, onde a arte aplica o agente próprio à própria matéria – como fogo a um combustível – da mesma maneira que animais são produzidos a partir de certas coisas em putrefação.

Todavia, mesmo que algumas alterações artificiais ocorram na água, seja por mistura ou por alteração, a natureza da água não é alterada; consequentemente, aquela água poderá ser utilizada no Batismo, a menos que, talvez, apenas uma pequena quantidade de água seja misturada artificialmente com um corpo cuja composição é eventualmente outra que a da água; assim, barro ou lama é terra e não água, e vinho diluído é vinho e não água.

Mas se a alteração for natural, algumas vezes ela destrói a natureza da água, e isso ocorre quando, por um processo natural, a água penetra na substância do corpo no qual ela é misturada; por exemplo, a água no suco de uvas é vinho e portanto não tem a mesma natureza da água. Algumas vezes porém, poderá ocorrer uma alteração natural da água, sem a destruição das espécies, e isto, tanto por alteração como foi visto no caso da água aquecida ao sol, como por mistura, como quando a água de um rio venha a se turvar por estar misturada com partículas de terra.

Todavia nós precisamos dizer que qualquer água pode ser usada para o Batismo, não importa o quanto tenha sido alterada, desde que a natureza da água não tenha sido modificada; porém se isso ocorrer, a água será imprópria para o Batismo.

Réplica à Objeção 1: A alteração na água do mar e em outras águas que temos em mãos, não é tão grande para destruir a natureza da água, e portanto, essas águas podem ser utilizadas para o Batismo.

Réplica à Objeção 2: O servo, mergulhado na água, não destrói sua natureza, assim como essa natureza não será alterada se houver uma imersão de carne, ou quando a água for aquecida, exceto se a substância aquecida ou mergulhada fique dissolvida de tal forma que o líquido adquira uma natureza diferente da água e, neste caso, nós poderemos ser guiados pela gravidade específica. Se, todavia, do líquido engrossado pudermos extrair água cristalina, ela poderá ser utilizada para o Batismo.

Réplica à objeção 3: A água que brotou do lado de Cristo quando pendurado na cruz não era o humor fleumático, como supuseram alguns, mas sim água pura que brotou miraculosamente como se fosse o sangue de um animal morto, para provar a verdade do corpo de nosso Senhor. É claro que um líquido deste tipo não pode ser utilizado no Batismo, como também não pode o sangue de um animal, ou vinho, ou quaisquer líquidos extraídos de plantas.

Réplica à Objeção 4: O Batismo pode ser conferido com solução esterilizante e as águas sulfurosas, porque estas águas não se incorporam artificial ou naturalmente com os elementos misturados, e não sofrem alteração de sua natureza.

Réplica à Objeção 5: Água-de-rosas é um líquido destilado das rosas, consequentemente ele não pode ser utilizado no Batismo. Pela mesma razão, águas químicas também não podem ser utilizadas, assim como o vinho. Não se deve fazer a comparação com as águas de chuva, nas quais a maior parte é formada de vapores condensados, e esses vapores por si próprios, formados de águas dos mares e rios, e contêm um mínimo de impurezas, sendo que este líquido, pela força da natureza, que muito mais poderosa que a arte, transformou pelo processo de condensação em água real, um resultado que não pode ser conseguido artificialmente. Consequentemente, a água da chuva não retém quaisquer propriedades de uma mistura, o que não pode ser dito de uma água química.

  • Autor: São Tomás de Aquino
  • Fonte: Suma Teológica, Parte III, Questão 66
  • Tradução: Dercio Antonio Paganini


                                                                                                                                                                                     Fernando Vanini de Maria

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