SOBRE O PECADO

 


A revelação do pecado no Antigo Testamento

 

Precisamos estabelecer  as bases bíblicas para compreender a realidade do pecado. Vamos buscar na revelação o conhecimento desta ruptura que o homem experimenta em si mesmo: se o homem olha dentro do seu coração se descobre também inclinado ao mal e imerso em tantas misérias que não podem certamente derivar do Criador, que é bom. O homem encontra-se dividido em si mesmo. Por isso, toda a vida humana, seja individual ou coletiva, apresenta as características de uma luta dramática entre o bem e o mal, entre a luz e as trevas (GS 13). Se, desde o início da história, o homem tentou atingir o seu fim prescindindo de Deus, também teve que aprender a conviver com aquilo que experimenta como mal, isto é, não o bem em si (Agostinho). A  teologia compreende o mal por meio de quatro dimensões: a existencial, a comunitária, a social e a cósmica. Além de essas dimensões expressarem, de forma ampla, a condição de pecaminosidade do ser humano, elas também contemplam as consequências geradas por ela. Visto como um desequilíbrio estrutural enraizado no coração humano, o pecado leva a pessoa a abusar da própria liberdade. Tal atitude gera um processo de destruição da ordem que é o fim último da vida, que contempla a experiência de harmonia consigo mesmo, com o próximo e com as coisas criadas. Essa situação provoca uma fragmentação da condição existencial, na qual a vida humana se apresenta “como uma luta dramática entre o bem e o mal” (GS, n. 13), fruto do egoísmo e do orgulho dos seres humanos (GS, n. 25).  No âmbito comunitário, a Igreja reconhece que, ao ser constituída por pessoas humanas, precisa constantemente de purificação por meio do exercício ininterrupto da penitência e da renovação (LG, n. 8). Ao ser ferida pelo pecado humano, a comunidade eclesial oferece, por meio do sacramento da penitência, o perdão às ofensas cometidas. Nesse aspecto, a caridade, o exemplo e a oração contribuem na dinâmica de conversão (LG, n. 11).

Já na dimensão social, o pecado é identificado na postura de diversas associações e instituições que não buscam o bem comum em suas atividades, mas apenas interesses próprios, não gerando - e, por vezes, dificultando - a construção da fraternidade (GS, n. 37). Exemplos concretos desses pecados sociais podem ser encontrados em estruturas econômicas, políticas e sociais. As desigualdades econômicas, a corrupção,

os governos ditatoriais, a privação dos direitos humanos, a intolerância, a escravidão, a prostituição, o mercado humano e os genocídios são amostras dessa condição de pecaminosidade. Por fim, na esfera cósmica, entende-se o pecado como o rompimento da harmonia com todas as coisas criadas. Isso ocorreu com a desobediência do primeiro humano, Adão, que quebrou a Aliança com Deus e, consequentemente, gerou uma deformação da realidade do mundo (GS, n. 39). No Antigo Testamento, existem diversas narrações que colocam em evidência a origem, a natureza e o crescimento do pecado. No livro do Gênesis, há diversas alusões à origem do pecado como transgressão da Aliança que Deus havia estabelecido com o ser humano (Gn 2,16-17; Gn 3,1-24). Abusando, de maneira soberba, de sua liberdade, Adão buscou a finalidade de sua vida fora do Criador:  “Estabelecido por Deus num estado de santidade, o homem, seduzido pelo maligno, logo no começo da sua história abusou da própria liberdade, levantando-se contra Deus e desejando alcançar o seu fim fora d’Ele. Tendo conhecido a Deus, não lhe prestou a glória a Ele devida, mas o seu coração insensato obscureceu-se e ele serviu à criatura, preferindo-a ao Criador”. (GS, n. 13). Assim, numa concepção geral, podemos afirmar que o pecado consiste na recusa do dom de Deus e na tentativa soberba de querer ser como Ele. A humanidade fora e permanece criada à sua imagem. O pecado deforma o projeto original, mas não o anula. O ser humano, porém, fica sem ter alguma referência definitiva. Só em Jesus encarnado/ressuscitado, cuja história pessoal também se tornou redentiva, é que o plano de Deus recuperou para o ser humano sua originalidade.”

É à luz da salvação que nos vem oferecida em Cristo, que a Escritura e o ensinamento da Igreja nos fazem ver o sentido profundo desta experiência humana: encontrando-se sob a escravidão do pecado, reconhece a necessidade da redenção e da recapitulação em Cristo. Os dois textos clássicos nos quais se fundamenta biblicamente o pecado original, termo que certamente não aparece na Escritura, são Gn 2-3 e Rm 5,12-21, ainda que no decorrer da história somaram-se a estes outros de menor importância (Salmo 50,7, Jó 14,4; Sab 2,23; Ef 2,3; etc). Contudo, não podemos declarar que em cada texto, por si só, encontraremos a prova evidente da doutrina do pecado original; é raro que se possa descobrir em um só texto o fundamento de um dogma. Apesar de haver textos de referência sobre o pecado original nas Sagradas Escrituras, eles não devem ser considerados como desenvolvimento doutrinário.

Essa função coube aos Padres da Igreja, que passaram a assumi-la a partir do século IV. Somente considerando tais textos em sua globalidade e dentro de um contexto bem maior, poderemos apresentar um argumento sólido.

Além da história da Criação, há outras passagens do Antigo Testamento que reforçam que todas as pessoas são pecadoras. Nos trechos a seguir, que falam da corrupção da humanidade, é possível perceber o pecado como algo inerente ao ser humano:

a) “ Senhor viu que a maldade do homem era grande sobre a terra, e que era continuamente mau todo o desígnio de seu coração” (Gn 6,5).

b) “Quando tiverem pecado contra ti - pois não há pessoa alguma que não peque …]” (1Rs 8,46).

c) “Como pode o homem ser puro ou inocente o nascido de mulher? (Jó 15,14).

d) Não existe um homem tão justo sobre a terra que faça o bem sem jamais pecar (Ecl 7,21).

 

Já em outras passagens, é feita uma alusão ao primeiro pecado e à existência de uma culpa hereditária. Nos livros proféticos, por exemplo, há versículos em que é anunciado o desdobramento do pecado dos pais nos filhos, não como castigo hereditário, mas como influência moral. Relembrando o descumprimento da Aliança, os profetas salientam, diversas vezes, a atitude das gerações passadas como consequência da situação de seu tempo:

- Deitemo-nos em nossa vergonha, cubra-nos a nossa confusão! Pois pecamos contra Iahweh nosso Deus, nós e nossos pais, desde nossa juventude e até o dia de hoje, e não obedecemos ao Senhor nosso Deus (Jr 3,25).

- Com efeito, ele me disse: “Filho do homem, enviar-te-ei aos israelitas, a esses rebeldes que se rebelaram contra mim até o dia de hoje. Os filhos são insolentes e de coração empedernido (Ez 2,3-4).

- Assim falou o Senhor: Por três crimes de Judá, e por quatro, não o revogarei [o decreto]! Porque desprezaram a lei do Senhor e não guardaram os seus decretos, suas Mentiras os seduziram, aquelas atrás das quais os seus pais correram (Am 2,4).

Nos livros sapienciais, também existem diversas passagens que inserem o pecado original em uma dimensão de universalidade:

- Quem pode dizer: “Purifiquei meu coração, do meu pecado estou puro”? (Pr 20,9).

- Quem fará sair o puro do impuro? Ninguém (Jó 14, 4).

- Pode o homem ser justo diante de Deus? Um mortal ser puro diante do seu Criador? (Jó 4,17).

- Eis que nasci na culpa, minha mãe concebeu-me no pecado (Sl 50,7).

- Não entreis em juízo com o vosso servo, porque ninguém que viva é justo diante de vós (Sl 142,2).

 

Tais concepções indicam que o pecado gera pecado. Por meio dessa lógica, o ser humano passa a ser responsável por sua vida e por seu futuro Além dessas passagens que remetem à natureza pecadora do homem ou ao próprio pecado original, há ainda aquelas que chamam atenção para a responsabilidade individual pelo pecado cometido. O profeta Ezequiel demonstra isso de maneira explícita ao reproduzir o discurso do Senhor:  “ odas as vidas me pertencem, tanto a vida do pai, como a do filho. Pois bem, aquele que pecar, esse morrerá. Se um homem é justo e pratica o direito e a justiça, [...] se age de acordo com meus estatutos e observa as minhas normas, praticando fielmente a verdade: este homem será justo e viverá” (Ez 18,4-5.9). Nessa passagem, o profeta destaca que a escolha feita diante do pecado determina o futuro da vida do indivíduo. As expressões morrer ou viver não se referem apenas à vida existencial, mas à vida junto ao Criador. Assim, a responsabilidade pelos atos não é aqui imputada a terceiros, ou ao próprio Deus, mas à escolha pessoal diante da observância ou não dos mandamentos.

No Antigo Testamento a existência do pecado aparece constantemente: um pecado que afeta essencialmente a relação do homem com Deus, acarretando, também,  uma ruptura com a comunidade. Em Israel, as relações entre o indivíduo e o grupo se integram e complementam entre si de tal modo que existe uma solidariedade no bem e no mal. Nesta relação recíproca, a culpabilidade individual comporta uma responsabilidade coletiva. Na narração da queda que vem apresentada em Gn 2-3, expressa no gênero literário sapiencial, o pecado é apresentado como ruptura da relação entre o homem e Deus, quando o homem pretendeu, livremente, ocupar o lugar de Deus e, além disso, desafiá-lo. Deste modo, manifesta-se o que, em síntese, é todo pecado no homem. Este é o início de uma história marcada pelo pecado. A reflexão sobre o gênero literário de Gen 2-3 feita pelos teólogos católicos, a coloca como uma narração etiológica, que não exclui sua índole fortemente simbólica. O Antigo Testamento, tomando como base Gn 2-3, nos proporciona alguns dados importantes da doutrina do pecado original: a existência de uma “pecaminosidade universal” que chega até o presente e tem sua origem histórica no começo da humanidade. Por outro lado, apesar da ideia de solidariedade – agora em seu aspecto negativo - de todos os homens no Antigo Testamento, não se encontra no mesmo uma conexão evidente entre a pecaminosidade universal e o primeiro pecado.

Portanto, no AT se afirma constantemente:

a) A existência humana marcada pelo sofrimento e pela morte. Estes aspectos da condição humana são decorrentes de uma relação com Deus defeituosa, porque essa é a relação fundamental da qual dependem todas as demais (o homem consigo próprio, com os outros, com o mundo).

 

b) A existência humana marcada pelo pecado. Existe ruptura de relações com Deus e com o próximo. Nisso consiste o pecado. E isso não é inevitável e nem normal. Não deveria ser, já que somos imagens de Deus e uma só carne com todos os homens.

c) Existe uma solidariedade de todos no pecado dos demais. Solidariedade que pode ser vista claramente, inclusive naqueles autores que valorizam e insistem na responsabilidade pessoal (Jr 31, 29; Ez 18, 2). Somos solidários tanto na “história “iniquitatis" como na “história salutis”.

 

A Revelação do pecado no Novo Testamento: o pecado na perspectiva da salvação.

 

Diante do Antigo Testamento que afirmava a pecaminosidade universal, o Novo Testamento, constatando o fato, declara que todos fomos redimidos do pecado por meio de Jesus Cristo. A realidade, a profundidade e a extensão do pecado universal somente podia ser captada inequivocamente à luz da salvação universal. É a cruz de Cristo e não a queda de Adão aquilo que nos dá a medida e as dimensões da nossa culpa. É o mistério da salvação que esclarece o mistério do pecado e não o contrário. Portanto, a compreensão acerca do pecado original é constituída com base na interpretação do Novo Testamento, centrado na pessoa e na ação salvífica de Cristo. contribuição decisiva do Novo Testamento à doutrina do pecado original não é encontrada nos evangelhos. Neles encontramos a visão do Antigo Testamento, mas colocada em relação com Cristo e com o Reino. É necessária uma metanóia, passar do coração de pedra ao coração de carne para entrar no Reino. É necessário um novo nascimento (Jo 3,1-7) realizado pela aceitação da fé (e seguimento) de Cristo, que define a realidade como um campo, onde crescem juntos trigo e cizânia e onde se escolhe caminhar na luz ou nas trevas. Para nos aprofundarmos na temática do pecado original no Novo Testamento, utilizaremos as epístolas paulinas como nossa chave de leitura. Na carta à comunidade de Roma (Rm 5,12-21), há uma passagem em que Paulo aborda essa questão sob o indicativo de que o pecado de Adão afeta todo o gênero humano.

Paralelo Adão e Jesus Cristo: Eis por que, como por meio de um só homem o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte, assim a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram, pois até a Lei havia pecado no mundo; o pecado, porém, não é levado em conta quando não há lei. Porém, a morte imperou desde Adão até Moisés, mesmo sobre aqueles que não pecaram de modo semelhante à transgressão de Adão, que é figura daquele que devia vir (Rm 5,12-14).

Como vemos, a doutrina é melhor esclarecida nos escritos paulinos e mais concretamente no texto da Carta de Paulo ao Romanos (citado acima).  Este texto tradicionalmente era lido na perspectiva de Santo Agostinho: “in quo” é uma expressão referida a Adão (todos estão incluídos no pecado de Adão). Contudo, hoje se sustenta que esta expressão quer significar “dado que, porquanto”. Fundamentalmente, o apóstolo quer nos ensinar a “superioridade” da obra redentora de Deus em Jesus Cristo sobre o pecado e a morte. E para demonstrar a eficácia universal da obra redentora de Jesus Cristo, Paulo coloca em relevo o paralelo entre Adão e Cristo, entre o Reino de Deus e aquele do pecado. Contrapõem-se duas formas distintas de solidariedade: a solidariedade de Adão com todos os homens (reino do pecado e da morte) e aquela de Cristo com todos os homens (reino da graça e da vida). Por isso, Paulo dirá que “como pela desobediência de um só homem todos foram constituídos pecadores, assim também pela obediência de um só todos serão constituídos justos” (Rom 5, 19 e 1Cor 15, 21-22.45-49). A balança entre a história de perdição e aquela de salvação se inclina sempre do lado de Jesus. A solidariedade de todos em Adão, origem do pecado e da morte no mundo, é superada somente pela solidariedade de todos em Cristo, que nos dá a Graça em abundância. Ele nos livra dos pecados pessoais (hemarton) e da força do pecado (hamartia), na qual somos introduzidos e para a qual nos inclinamos, inevitavelmente.

Paulo distingue entre pecado (hamartia) e transgressão (parábasis – Rom 12,14), desobediência (v.19), delito (v. 15.17.19). O que entra na história, o pecado (hamartia) não é uma transgressão, mas a força do mal expressa e continuada pelos pecados de todos. Por isso, reina a morte, entendida não somente no sentido biológico, mas total, isto é, separação de Deus, alienação, etc. Paulo distingue entre pecado (hamartia) e transgressão (parábasis – Rom 12,14), desobediência (v.19), delito (v. 15.17.19). O que entra na história, o pecado (hamartia) não é uma transgressão, mas a força do mal expressa e continuada pelos pecados de todos. Por isso, reina a morte, entendida não somente no sentido biológico, mas total, isto é, separação de Deus, alienação, etc. Paulo resume nestas passagens a ideia de que a história e a situação de pecado não possuem Deus como autor, mas o próprio homem. Contudo, não interessa tanto falar deste pecado e sim da universalidade da salvação em Cristo, que se estabelece na aceitação de Cristo pela fé, recebendo dele a filiação e a koinonia e passando da solidariedade com o corpo de pecado para aquela com o Corpo de Cristo.

Resumindo, para Paulo, todos são afetados pela desobediência de Adão, pois continuam em sua existência o desdobramento da lógica do pecado. Em outras palavras, o apóstolo evidencia a predisposição humana ao pecado. A punição de Adão, que se estendeu a toda a sua descendência, consiste na privação da Visão (de Deus) e da imortalidade confiadas por Ele. A punição pelo pecado original somente pôde ser rompida quando foi oferecida à humanidade a Salvação. Isso ocorreu por meio da vinda de Jesus Cristo, apresentado como “novo Adão”, aquele por meio do qual a Salvação entrou no mundo. Como afirma o apóstolo, “ e pela falta de um só a multidão morreu, com quanto maior profusão a graça de Deus e o dom gratuito de um só homem,Jesus Cristo, se derramaram sobre a multidão” (Rm 5,15). Portanto, o apóstolo apresenta a temática do pecado original de uma perspectiva cristológica, cujo cerne é a afirmação de que a justificação do pecado vem por meio da graça que nos é concedida pela fé em Cristo. Assim como a morte entrou no mundo por meio de Adão, sendo a humanidade privada da imortalidade, em Cristo todos reviverão para a vida eterna ao lado do Senhor, podendo ter restaurada a visão dele."

É preciso ter presente, que de fato não encontramos uma apresentação completa e esquematizada do pecado original na Escritura, mas uma série de elementos que a Igreja desenvolverá posteriormente. Recolhemos como essenciais da Revelação bíblica os seguintes ensinamentos:

a) A pecaminosidade universal que faz do mundo um reino de pecado e que se manifesta pessoal e socialmente.

b) O convencimento de que a origem do mal foi uma opção humana culpável situada no começo da história.

c) A função mediadora de um ato humano (Adão) no estado universal de perdição e o reestabelecimento da mediação em Jesus Cristo.

d) A livre decisão pessoal é aquela que confirma nossa solidariedade no destino prévio de graça ou de perdição .

 

Considerações históricas e sistemáticas sobre o pecado original.

 

Façamos agora um percurso histórico, acompanhando em linhas gerais o desenvolvimento da doutrina do pecado original como foi se consolidando na Tradição da Igreja. A questão do pecado original foi desenvolvida, em um primeiro momento, pelos Concílios de Cartago (1) e de Orange (2) Isso porque, na época, havia grande preocupação da Igreja com relação à doutrina em razão dos embates com as heresias. Posteriormente, a doutrina do pecado original foi definida no Concílio de Trento(3)

 

 

(1) O Concílio de Cartago (418) ocorreu com a presença de 214 bispos. Nesse concílio, foram elaborados nove cânones sobre a doutrina do pecado original e da necessidade da graça.

(2) O Concílio de Orange (441-529) foi realizado em duas fases. Em seus 25 cânones, estabeleceu-se a doutrina que refuta a visão semipelagiana de que o ser humano, apesar de sua natureza pecadora, ainda pode responder à graça de Deus por meio de atos de boa vontade.

(3) O Concílio de Trento (1545-1563) foi o 19° Concílio Ecumênico da Igreja, realizado em três períodos. Tinha como objetivo primordial garantir a unidade da fé e discutir questões relacionadas à disciplina eclesiástica. Os principais cânones estabelecidos se referem à interpretação da Escritura e à importância da Tradição, ao pecado original e à justificação .

 

 

1. Quatro primeiros séculos: «Padres» da Igreja (Patrística)

 

O pecado original é visto como um estado herdado de Adão, pelo qual a humanidade recebe como herança uma corrupção que se manifesta particularmente na morte. Para os Padres, todos os homens estão afetados negativamente pela decisão de Adão e, por conseguinte, costuma-se afirmar que o fato de que o homem peque é possível por causa do pecado de Adão. Aflora, também, cada vez mais frequente, a frase “todos pecamos em Adão” (tradução incorreta de eph’ho de Rom 5,12) sublinhando a implicação no pecado de Adão e a solidariedade de todos os homens com ele, ainda que desde a tipologia Adão-Cristo se acentua sobretudo a unidade e a solidariedade de todos os homens em Cristo. A realidade do pecado entra na perspectiva unitária da história da salvação e, assim, o rito de batizar as crianças começa a ser fundamentado na necessidade de que todo o ser humano tem de ser tocado pela ação salvífica de Cristo.

 

2. Santo Agostinho

No século IV, Santo Agostinho (354-430) sistematizará a doutrina do pecado original em sua controvérsia contra os pelagianos e usará pela primeira vez o termo «peccatum originale». De acordo com Daniélou (1964), os sete pontos principais da doutrina pelagiana são: 1) Adão deveria morrer, mesmo se não tivesse pecado; 2) O pecado de Adão prejudicou apenas a ele, e não toda a humanidade; 3) Os recém-nascidos encontram-se na mesma condição que Adão antes de seu pecado; 4) A humanidade não está sujeita à morte por causa do pecado de Adão; 5) A Lei conduz ao céu, tanto quanto o Evangelho; 6) Antes da vinda de Jesus, havia seres humanos sem pecado; 7) As crianças podem obter a vida eterna, mesmo sem o batismo. ponto central da controvérsia pelagiana está na possibilidade de o ser humano salvar-se por si mesmo, sem o auxílio da graça. Para os pelagianos, o ser humano nasce em um estado de inocência e, consequentemente, seria possível alcançar a perfeição por meio das próprias ações. A realidade do pecado e da graça é profundamente negada por essa doutrina. Santo Agostinho se opôs de forma veemente a essa estrutura doutrinária. Fundamentando-se na passagem da Carta de São Paulo aos Romanos, que expressa que em Adão todos os seres humanos pecaram (Rm 5,12), Agostinho salienta que a realidade do pecado é inerente à vida humana. Para ele, o primeiro homem criado, Adão, fez mau uso de sua liberdade por meio da soberba, rompendo a Aliança com Deus e, consequentemente, submetendo a humanidade à morte e ao jugo do pecado.  O que houve foi um rompimento “incontestável das relações humanas, ou [uma] desobediência ao santo mandamento de Deus, [que gerou uma] ruptura da comunhão com Ele. Nessa perspectiva, Agostinho afirma que a possibilidade de justificação do pecado original só pode advir da ação da graça de Deus. Diz Agostinho: “ isto que o livre-arbítrio foi dado ao homem por Deus, e perdido pela escolha do pecado, ele não pode ser recuperado senão através da ação da graça de Deus”. Portanto, quem de modo conveniente se serve da lei, chega ao conhecimento do mal e do bem e, não confinado na sua força, refugia-se na graça, cujo auxílio lhe dá forças para se afastar do mal e fazer o bem. E quem recorre à graça? Não é aquele cujos passos são orientados pelo Senhor e escolhe seus caminhos? (Sl 36,23). Assim, o desejo da graça é início da graça, da qual fala o salmista: Então eu digo: Agora começo: está mudado a destra do Altíssimo (Sl 76,11). Consequentemente, devemos confessar que temos liberdade para fazer o mal e o bem; mas para fazer o mal, é mister libertar-se da justiça e servir ao pecado, ao passo que na prática do bem, ninguém é livre, se não é libertado por aquele que disse: Se, pois, o Filho vos libertar; sereis, realmente, livres (Jo 8,36). Mas ninguém pense que, uma vez libertado da sujeição ao pecado, não lhe é mais necessário o auxílio do libertador. Pelo contrário, ouvindo dele: Sem mim nada podeis fazer (Jo 15,5), responda-lhe: Tu és minha ajuda; não me deixes (Sl 26,9). influência de Agostinho será determinante no desenvolvimento posterior da doutrina. O Santo Bispo descobre progressivamente que Cristo é o Redentor de todos e por isso, quer salvar – diante do papel secundário e exemplar que desempenha Cristo no pelagianismo - a necessidade universal de Cristo redentor. Partindo dessa necessidade absoluta que todos os homens precisam de Cristo para conseguir a salvação, começa a afirmação da universalidade absoluta do pecado. Todos nascem com um pecado distinto dos pecados pessoais e somente a graça de Cristo liberta os homens desta situação. Assim, Santo Agostinho admite nas crianças um pecado já que pensar contrariamente poderia significar que estes não necessitam da redenção de Cristo e que então Cristo não seria o redentor de toda a humanidade. O batismo cancelaria o pecado original e as crianças que morrem sem ele sofrem uma espécie de condenação. Para Agostinho, a situação do homem ao nascer assemelha-se à do homem que comete um pecado pessoal, enquanto implica a morte da alma (ou seja, a privação da graça) e a perversidade da vontade (concupiscência dominante) como consequência do pecado pessoal de Adão.

3. Teologia Escolástica

A teologia escolástica move-se sob a ótica agostiniana, em continuidade com o ensinamento magisterial. Fundamentalmente aparecem três questões na reflexão escolástica: a natureza do “pecado original” (em que consiste); sua “transmissão” (seu modo de difundir-se) e o tipo de “pecaminosidade” (em que sentido é pecado). As explicações a essas questões abertas virão das distintas tendências predominantes: a “corrente agostiniana” (Pedro Lombardo e Escola de Lião) via na concupiscência habitual a essência do pecado original e, em certo modo, este se transmitia por geração; a “corrente anselmiana" via o pecado original como a perda da justiça original e a geração não seria a causa mas a condição de transmissão do pecado.

Em Santo Tomás se chega a uma síntese das anteriores correntes, quando o mesmo afirma que a essência do pecado original, no qual se encontra todo descendente de Adão, consiste materialmente na concupiscência enquanto que, formalmente, na ausência da justiça original. Com respeito à transmissão do pecado original, segue a corrente anselmiana, mas dentro de uma concepção da humanidade como solidariedade corporativa.

Com o nominalismo, (séculos XIV e XV), reaparece o agostinianismo que insiste na concupiscência como elemento formal do pecado original e se esquece a tese tomista. As intervenções do Magistério são pouco significativas neste período.

4. Concílio de Trento

Na sessão V do Concílio de Trento, no ano 1546, foram retomados os ensinamentos magisteriais que tinham sido formulados no Concílio de Cartago (418) o qual, utilizando pela primeira vez o termo pecado original tinha condenado o pelagianismo. São retomados, também, os ensinamentos do Concílio de Orange (529), que concluiu a controvérsia semi-pelagiana. A intenção dos padres conciliares nos cânones desta breve sessão consistia em, mais do que apresentar uma visão completa do problema, opor-se a alguns erros com respeito ao pecado original (pelagianismo, protestantismo) que se distanciavam da fé da Igreja Católica.

Por esta razão, deixou várias questões abertas, que permaneciam discutidas entre os teólogos católicos , tais como “em que consistia o estado de justiça original” ou “em que modo o pecado é pecado original” ou “por que todos somos solidários no pecado”. Considerando aquilo que o Concílio propõe como dado de fé e traduz em palavras e fórmulas, podemos destacar na definição do dogma elaborado os seguintes ensinamentos normativos:

a) A existência do pecado original, morte da alma (cân. 2);

b) que afeta interiormente a todos (cân. 2, 3, 4);

c) do qual somente a graça de Cristo, dada pelo Batismo, pode libertar-nos (cân. 3 e 4);

 

d) o Batismo cancela totalmente quanto existe de pecado no batizando, mas a concupiscência permanece depois do batismo, porque não é pecado em sentido próprio na pessoa dos batizados (cân. 5);

e) A situação universal de pecado possui como fator desencadeante a ação histórica engendrada pela liberdade humana (cân. 1).

Por último, convém distinguir no decreto os níveis diferentes aos quais pertencem as afirmações. Poderia estabelecer-se uma ordem normativa onde o nível mais profundo seria de índole cristológica: o homem necessita da graça de Cristo, o único que dá a todos a salvação. Um segundo nível, unido ao anterior, seria o eclesiológico-sacramental, já que a salvação de Cristo acontece na Igreja, que administra o Batismo para o perdão dos pecados. Em terceiro plano estão as afirmações antropológicas, pois se vê como a humanidade não incorporada a Cristo está oprimida pelo pecado que lhe impossibilita a salvação. O quarto nível é o etiológico, que caracteriza a pecaminosidade humana em relação ao relato de sua origem (pecado original originante).

5. Do Concílio de Trento ao Concílio Vaticano II

 

Até o século XX a intervenção mais importante do Magistério com relação ao pecado original pode ser considerada a condenação de M. Bayo pelo papa Pio V com a bula Ex omnibus afflictionibus (1/10/1567) e, pouco antes do Concílio Vaticano II, a Encíclica Humani generis de Pio XII (12/08/1950) onde se alude ao pecado original no contexto das teorias da evolução. Se o Concílio Vaticano I não chegou a tratar o tema, no Vaticano II encontramos poucas referências à questão do pecado original. Fala-se dele para iluminar a situação do homem no mundo. Sem entrar em matéria discutível, considera-se a doutrina tradicional, ainda que com uma linguagem existencial e em perspectiva salvífica (GS 10,13,18,22; LG 2; SC 6). O Vaticano II refere-se ao tema, sobretudo, em LG 13, quando fala que o homem, no início da história, abusou de sua liberdade e ergueu-se contra Deus buscando conseguir sua finalidade última fora Dele e causando em si mesmo uma divisão profunda, de modo que toda a história e a humanidade encontram-se envolvidas em uma luta entre o bem e o mal. Durante os anos posteriores ao Vaticano II, o tema ganhou atualidade. Paulo VI reafirmou o dogma tradicional tanto no Simpósio organizado sobre o tema (1966) como nos números 16-18 do Credo do Povo de Deus (1968) e no ponto 2 da declaração que uma comissão de Cardeais realizou – sob sua direção – a respeito do Novo Catecismo Holandês. Os teólogos, por outro lado, procuraram repropor de maneira nova a doutrina tradicional do pecado original. Por último, o Magistério de João Paulo II, sem entrar em problemas controversos, reafirmou a formulação dogmática.

Após este percurso histórico podemos afirmar que a doutrina do pecado original nada mais é que o aspecto negativo da solidariedade dos homens em Cristo. Ela pressupõe ao mesmo tempo em que o homem tenha sido criado por Deus "na graça", que desde o primeiro momento Deus tenha oferecido ao homem sua amizade. Somente partindo disso tem sentido falar de pecado como ruptura da aliança com Deus, da comunhão com Ele. Não podemos pensar concretamente num ser humano nem na humanidade concreta sem essa oferta da comunhão com Deus e da graça. Na teologia tradicional, houve um debate acerca do problema de se essa graça ou amizade originária do homem com Deus era já a graça de Cristo. E de fato, não conhecemos outra "graça" além da autocomunicação de Deus em Jesus Cristo, seu Filho. Se o primeiro Adão é figura daquele que devia vir, já no primeiro instante Deus deve ter-lhe oferecido sua graça em vista de Jesus, que é essa "Graça" em pessoa. E a partir dessa graça e da amizade com Deus que ela significa, devem ser vistas também as consequências antropológicas de harmonia do homem consigo mesmo, com os outros e com a natureza, que a Bíblia nos apresenta de modo tão sugestivo na narrativa do paraíso.

A afirmação fundamental no que diz respeito ao “estado original" é precisamente esta, que o homem no estado de harmonia com Deus em que foi criado e a que foi destinado é também um ser integrado em suas dimensões pessoais, cósmicas e sociais. Não podemos tampouco nos esquecer da dimensão escatológica dessas narrativas protológicas: o plano original de Deus realizar-se-á no fim dos tempos.

A doutrina do pecado original mostra-se hoje mais do que nos últimos tempos centrada nos aspectos teológico e cristológico, uma vez que foi "aliviada", por assim dizer, de questões que são antes que de índole científico-natural, mas que pareciam intimamente ligadas a outras de interesse dogmático e de interpretação da Escritura: valor "histórico" dos primeiros capítulos do Gênesis, problemas de evolução, do poligenismo ou monogenismo etc. Além disso, a exposição da doutrina do pecado original não pode ser feita de tal modo que pareça pôr em dúvida a vontade salvífica universal de Deus, a eficácia da redenção de Cristo etc. Antes, é preciso fazer o contrário. Somente à luz da salvação de Jesus e para explicar em que ela consiste se fala da situação de pecado em que se encontra a humanidade. Se existe algo claro no Novo Testamento e na tradição é que a doutrina do pecado original se desenvolveu apenas a partir da perspectiva da salvação que Jesus nos oferece, não como um ensinamento "prévio" à cristologia. Vimos, então, que a origem do pecado e sua universalidade estão em um «pecado original originante»:

a) O pecado original explicado em chave de evolução: Alguns teólogos quiseram encontrar o fundamento do pecado não somente na liberdade humana, mas no mesmo cosmos e no mundo pré-humano. Neste sentido, o pecado original seria uma realidade de ordem trans-histórica, mais que um elemento da série de acontecimentos históricos. Cristo, pelo contrário, seria aquele que sobrepassa em si e em todos os homens as resistências à unificação e à ascensão espiritual que encontramos na matéria. Essa é a posição de Teilhard de Chardin, Schimidt, Moormann e Segundo.

Contudo, não parece que estas tendências foram seguidas na teologia recente. A tendência da teologia católica foi a de distinguir entre o pecado e a limitação humana, a opção negativa diante de Deus e as carências criaturais que devem ser superadas. O pecado “originado” chama em causa um pecado “originante” não somente uma origem, mas especificamente um pecado de origem.

b) O “pecado do mundo”: Na concepção tradicional do pecado original, acentuava-se quase exclusivamente o pecado de Adão para explicar o estado de pecado no qual a criança vem ao mundo. Na teologia moderna, mais bíblica, colocou-se a questão sobre se a herança de pecado e privação de graça que o homem recebe está determinada somente por um pecado inicial ou se foi produzida também pelo acúmulo de pecados cometidos por todos os homens. A resposta teológica católica inclina-se, em geral, pela aceitação desta segunda possibilidade. Nessa questão de colocar a doutrina do pecado original no âmbito mais vasto do ”pecado do mundo” foi notável a influência de Schoonenberg. Para ele, o pecado originante é “o pecado do mundo”, entendendo-se o conjunto das ações pecaminosas cometidas ao largo da história. Não é preciso reconhecer uma influência especial do primeiro pecado; esse não teve mais importância que qualquer outro, é um dente a mais na engrenagem que constitui o maquinário do “reino do pecado”.

c) “Pecado de Adão” e “pecado do mundo”

 

A Escritura e alguns elementos da antiga Tradição da Igreja contribuíram na recuperação do “pecado do mundo” neste contexto do pecado original, como causador, ao menos em parte, da situação do afastamento de Deus, na qual a humanidade se encontra. No entanto, isto não significa para a maioria dos teólogos “abandonar o valor especial do primeiro pecado”, do “pecado de Adão” em sentido estreito. Muitos, aceitando que todos os pecados são causadores da atual situação da humanidade, creem que se deva conceder ao primeiro pecado uma relevância peculiar, ainda que possa haver (e existam de fato) discrepâncias notáveis no modo de conceber isso.

Não existe contradição entre o “pecado de Adão Adão” e o “pecado do mundo” não se trata de uma alternativa. Ambos se exigem mutuamente: o segundo sem o primeiro deixa de ter explicação. E o primeiro manifesta o real peso do segundo. Sem dar ao primeiro pecado uma relevância especial, não se vê como se pode salvar a universalidade da condição pecadora da humanidade. O domínio do pecado e o afastamento de Deus entraram no mundo desde o começo, ainda que não só este momento seja responsável de todo o mal que agora vivemos.

3.4 Os efeitos do pecado original Para falar destes efeitos do pecado original, é fundamental distinguir entre pecado original originante (o que é causa - cometido no inicio da história, que deu origem ao mal em que agora vivemos e que experimentamos) e o pecado original originado (são estas consequências negativas em nós, nossa situação de isolamento em relação a Deus, que tem no pecado “originante” sua causa e seu fundamento), que é o que nos interessa no momento:

• Pecado original originado

 

- Ponto de partida: a experiência de divisão interna e externa do homem

O texto de GS 13 nos fala da experiência humana e da divisão interna e externa que se encontra em cada ser humano. Cada homem sofre as consequências desta ruptura, mas esta afeta, também, segundo o Concílio, toda a vida humana, individual e coletiva. Esta situação na qual se encontra a humanidade é a que nos descreve a Escritura e toda a Tradição da Igreja. Partindo desta experiência humana, na luz da fé em Cristo, a Tradição da Igreja tratou de explicar qual é o sentido teológico desta situação.

- O “pecado original” como privação da comunicação da graça

A mediação da graça de Cristo que o homem poderia receber ao vir ao mundo falhou. E essa mediação positiva, não existindo, converte-se em mediação negativa, em um verdadeiro obstáculo para o desenvolvimento pleno do ser humano em sua relação com Deus, sendo fonte de novos pecados pessoais. A partir do pecado de Adão, dessa primeira deficiência de comunicação da graça, faz estrada a história de pecado. O pecado pessoal é a inserção, livremente ratificada, nesta corrente de pecado que Adão iniciou.

Esta corrente de pecado dá lugar às “estruturas de pecado”, que originalmente não podem ser separadas das culpas pessoais de cada homem, mas que, depois, em seu crescimento e desenvolvimento, produzem situações de difícil superação e controle, também por parte de quem as iniciou, e se convertem por sua vez em fonte de novos pecados. Pode-se entender o pecado original originado a partir desta privação da graça querida por Deus como consequência da ruptura da comunicação de amor e de bem que de fato produziu-se na história. Esta comunicação que deveria realizar-se no desígnio originário de Deus não tem lugar agora e a privação da presença de Deus e da graça que quis dar-nos é “pecado” ainda que não em sentido de culpa pessoal (conceito unívoco de pecado), mas de modo análogo (que não significa impropriedade).

O homem que chega a este mundo encontra-se privado da comunicação e da mediação da graça, o que o faz pecador, em solidariedade (negativa) com todos os demais homens; incapacitando-o para o bem e induzindo-o à ratificação pessoal – por meio dos pecados pessoais – desta situação herdada ou recebida.

A partir desta concepção, relativiza-se o problema da transmissão do pecado original por geração física. Esta é somente o meio (veículo) e não a causa. O Magistério quer evitar que esta transmissão seja considerada mera imitação, ou seja, que o pecado anterior a cada um seja algo exterior a ele. A transmissão por geração significa que este é um elemento a mais da condição humana que cada um recebe pelo fato de seu nascimento e que os efeitos deste pecado estão presentes desde o primeiro instante.

Deve-se entender a geração humana em um sentido integral que leva em consideração muitos fatores e não somente físicos (entrada em um meio humano e cultural, em uma sociedade). Todos estes âmbitos estão afetados pela privação da mediação de graça. Desde este ponto de vista não se requer nem mesmo o monogenismo para a explicação do pecado original. O pecado da humanidade que nos precedeu pesa sobre o ser humano que vem ao mundo e pesa sobre toda a humanidade. Pesa enquanto impede a união com Deus, mediada por Cristo e a união entre os homens, enquanto supõe uma “diminuição” da presença de Deus e de seu Espírito. A negação da verdadeira solidariedade humana, que se nota na participação ao pecado de Adão, encontra sua expressão máxima nos pecados pessoais.

- O pecado original nas crianças :

O caso das crianças não deve constituir o eixo do estudo sobre o pecado original. É no pecado pessoal do adulto que se manifesta em maior grau a falta de mediação positiva da graça, a solidariedade negativa em Adão. Se o pecado afeta os homens antes de toda decisão, também afeta as crianças, que necessitam de Cristo e da sua graça. Elas contraíram algo do pecado de Adão que deve ser lavado no Batismo.

- As consequências do pecado original depois do Batismo

No Batismo, o homem é plenamente renovado e desaparece dele todo pecado, ainda que permaneçam umas consequências ou efeitos desse pecado original no homem regenerado. Não nos separamos inteiramente do mundo de pecado. A mediação negativa do mal segue atuando em nós enquanto estivermos no mundo. Na teologia do “estado original” e na narração bíblica do paraíso, se fala da condição inicial do homem no estado de amizade com Deus. Os bens “preternaturais” seriam aqueles dons que o homem e a mulher tinham antes do pecado original. Tais dons, recebidos nas origens, quando o homem e a mulher viviam ainda na situação de comunhão com Deus (no Paraíso). No Magistério se fala principalmente de dois: a integridade ou ausência de concupiscência e a imortalidade.

- A concupiscência

 

Definir a concupiscência não é fácil. Por vezes é considerada uma insubordinação das tendências inferiores do homem às superiores e racionais. Neste sentido, seria um conceito neutro, pertenceria à natureza do homem (…) Sem desmerecer tal concepção, pessoalmente prefiro uma noção mais teológica, que vê a integridade na liberdade ou ausência de dificuldade em fazer o bem que vem da harmonia com Deus, por conseguinte, a concupiscência deveria ser vista como a diminuição da liberdade produzida pelo pecado e que, mesmo quando ele já foi perdoado, continua a pesar em nós, em nosso ser criatural”.  - A morte

Na Sagrada Escritura se estabelece uma relação entre ela e o pecado. Na medida em que o justo segue sendo pecador, a morte continua oferecendo um aspecto inquietante e suscitando uma angústia irreprimível e a solicitação ao mal persiste como real ameaça de desintegração e como experiência de alienação interior. Em outras palavras: enquanto (e porque) a graça co-existe com o pecado, a imortalidade e a integridade se veriam permanentemente pressionadas pela morte e pela concupiscência; não seriam dons pacificamente possuídos de uma vez por todas, mas uma conquista trabalhosa e somente conseguida plenamente no eschaton.

Quanto à maldade e ao sofrimento humanos, eles não são, em sentido algum, subestimados pela fé: a fé não está, sob o pretexto de proclamar a felicidade eterna em um mundo futuro, de modo algum inclinada a ignorar os muitos tipos de dor e sofrimento que afligem os indivíduos, nem a óbvia tragédia coletiva inerente a muitas situações. Apesar de tudo isso, a fé tampouco se alegra com o mal e os momentos de tribulação por si mesmos, como se não existisse sem a presença deles.

Aqui, pelo menos como primeiro passo, a fé contenta-se simplesmente em tomar nota e registrar. Portanto, não é permissível acusar a fé de fechar seus olhos; mas é igualmente inadmissível ter ressentimento em relação à fé, acusando-a de tratar o mal e o sofrimento como fatos fundamentais sem os quais ela não teria fundamento digno de crédito. Como se, em resumo, a fé só pudesse basear-se, como condição sine qua non de sua existência, na desgraça da condição humana e no efeito e reconhecimento desse desespero.

De fato, o mal e o sofrimento não são, em primeiro lugar, funções de nenhuma interpretação teológica da vida em particular, mas uma experiência universal. Não se trata somente de ficar “teorizando” o sofrimento. E o primeiro movimento da fé, diante do mal e do sofrimento, não é explorá-los para os seus próprios fins! Se a fé cristã os leva em consideração é, em primeiro lugar, simplesmente para fazer uma avaliação coerente e sincera da real e concreta situação histórica da raça humana. E a única preocupação da fé é saber se, como e em que condições a sua visão dessa real situação histórica ainda pode conquistar a atenção e a adesão das pessoas hoje — ao mesmo tempo em que leva em consideração as análises das próprias pessoas quanto à sua condição e as atitudes que adotam nas diferentes situações que têm de enfrentar.

No entanto, a fé cristã de fato tem uma perspectiva específica sobre a condição humana que, em muitos aspectos, ilumina aquilo que muitas visões de mundo não-cristãs afirmam ao seu próprio modo. Primeiramente, a fé destaca que o mal aparece como estando sempre presente na história e na humanidade: o mal transcende e precede todas as nossas responsabilidades individuais e parece surgir de "forças" e até de um "espírito" que estão presentes antes de agirmos e, até certo ponto, são externos a qualquer consciência e vontade pessoal em ação aqui e agora. Aqui o entendemos enquanto “mistério do mal”.

Em segundo lugar, a fé observa que o mal e o sofrimento que afetam a condição histórica dos seres humanos também têm, e mesmo em grande parte, sua fonte no coração dos seres humanos, nos seus reflexos egoístas, no seu apetite pelo prazer e pelo poder, na sua silenciosa cumplicidade com o mal, em sua covarde capitulação diante do mal, em sua terrível dureza de coração. É o que chamamos de “mal moral”. Mesmo assim, a revelação bíblica e a fé cristã não desanimam com a pessoa humana; ao contrário, continuam a apelar ao livre arbítrio, ao senso de responsabilidade, à capacidade de adotar ações decisivas no sentido de mudar — e àqueles momentos de lúcida consciência em que essas faculdades podem ser efetivamente exercitadas (processo de conversão, “metanoia”). A fé acredita de fato que todos são fundamentalmente capazes tanto de se distanciar de tudo o que os predispõe de uma forma negativa quanto de abdicar de seu próprio egoísmo e preocupação consigo mesmo para se comprometer com o serviço ao próximo e, desse modo, abrir-se para uma esperança viva que poderia até ultrapassar todos os seus próprios desejos. Para a fé cristã, portanto, os seres humanos, por um fato histórico (neste horizonte se encontra a origem do mal moral para os cristãos), estão alienados da santidade de Deus por causa do pecado, além de sermos diferentes de Deus em virtude de termos sido criados (condição criatural) em vez de ser intrinsecamente divinos. Essa dupla diferença entre Deus e a humanidade encontra testemunho nas Escrituras e é pressuposta por todos os cristãos ortodoxos que escreveram nos tempos pós-bíblicos. Mas a iniciativa divina de se aproximar com amor da humanidade pecadora é uma característica contínua do modo de Deus nos tratar, antes e dentro da história, e é a pressuposição fundamental da doutrina da redenção. Portanto, a dialética da graça e do pecado pressupõe que, antes que qualquer pecado entrasse no mundo, a graça de Deus já havia sido oferecida aos seres humanos: ele nos escolheu nele (em Cristo) “antes da fundação do mundo” (cf. Ef 1, 4). Como veremos em outro tratado, fomos criados em estado de “graça original”. A lógica interna da visão cristã da condição humana exige, também, que Deus seja o autor da redenção, pois o que precisa ser curado e salvo é nada menos do que a imagem do Próprio Deus em nós.

Para a fé cristã, a verdade da redenção sempre iluminou particularmente os aspectos da condição humana que apontam de modo mais óbvio para a necessidade humana de salvação. Os seres humanos experimentam fragmentação, inadequações e frustrações na vida, em muitos níveis. Na medida em que os seres humanos frequentemente consideram-se responsáveis pela fragmentada e insatisfatória qualidade de sua experiência, eles confessam, em linguagem tradicional, o seu estado de pecadores (necessitados de salvação). Realidades tais como a fome, a pestilência, as catástrofes naturais, as doenças, o sofrimento físico e mental e a própria morte revelam que o mal — como a tradição cristã, claro, sempre reconheceu — de modo algum se esgota no que se chama de "malum culpae" (mal moral), mas também compreende o "malum poenae" (sofrimento), seja este o mal em si mesmo ou tenha origem nas limitações da natureza. O mal faz mal. Tradicionalmente, no entanto — como revela o próprio testemunho bíblico — todo sofrimento, e até mesmo a própria morte, tem sido entendido como resultado do pecado, "o mistério da impiedade", nas palavras de São Paulo (2 Ts 2,7).

Embora os desafios que acabamos de mencionar sejam as dificuldades existenciais mais básicas enfrentadas pelo homem, há também toda uma série de outros problemas mais íntimos com que as pessoas se defrontam. Em primeiro lugar, elas têm dificuldade em atingir, como indivíduos, o equilíbrio pessoal interior (aspecto pessoal/existencial). Em segundo lugar, sentem dificuldade em viver em harmonia com os demais seres humanos, conforme revela a história das guerras com toda a sua inerente crueldade e horror (dimensão social do pecado). Em terceiro lugar, sua incapacidade de viver bem com a natureza não-humana é dramaticamente refletida na questão ecológica do mundo contemporâneo (dimensão cósmica).

Deste modo, podemos perceber que não é somente uma dimensão que precisar ser “salva”. Não somente a “alma”. Mas também o “cosmos”, a “criação”, a “história”. Houve uma certa diluição do sentido teológico da história e uma insistência unilateral no problema da santificação pessoal, isso é atestado já no próprio seio do judaísmo com a evolução da literatura sapiencial enquanto oposta à corrente apocalíptica. A este respeito são oportunas as perguntas do Papa Bento XVI: “Como pôde desenvolver-se a ideia de que a mensagem de Jesus é estritamente individualista e visa apenas o indivíduo? Como é que se chegou a interpretar a «salvação da alma» como fuga da responsabilidade geral e, consequentemente, a considerar o programa do cristianismo como busca egoísta da salvação que se recusa a servir os outros?” (Spe Salvi, 16). É preciso retomar que nada ficará alheio ao poder redentor de Cristo. Tudo entrará na dimensão de Deus. Nesta perspectiva de uma visão focada estritamente na salvação do “individuo” não é mais a história, no sentido em que empregamos a palavra, que implica, para nós, uma unidade, uma continuidade e um sentido. Se apresentam poucas perspectivas abertas para o futuro, ou então bem vagas; nenhuma alusão ainda que indireta a um Messias esperado. Acaba que o único problema tratado é o da Sabedoria e da salvação pessoal. E este fenômeno se mostra presente ainda hoje: a consciência de participar desta grande aventura coletiva que chamamos a história tende a se apagar em proveito do drama estritamente pessoal. Se esquece que o “juizo universal”, versará sobre nossa condição enquanto membros da comunidade humana, implicados na dramática e complexa existência histórica.

Pode-se dar o contrário nos períodos de calma e de segurança de uma civilização florescente – e isso, é claro, para os homens pertencentes à classe dirigente desta sociedade, beneficiários do sistema social e de sua prosperidade: pode, então, se estabelecer o sentimento de que não há daí em diante tarefa propriamente histórica a assumir "Deus está no seu céu: tudo vai bem na terra”: cada um deve apenas cultivar com atenção o seu próprio jardinzinho. Daí a experiência privilegiada que é a das grandes catástrofes, quando o sangue dos inocentes e o sangue dos mártires clamam ao céu: “Até quando?…” A vida pessoal fechada, então, explode e, na fraternidade de uma miséria comum ou na exaltação de um combate travado em conjunto, o homem redescobre que está inserido num movimento de dimensões e de alcance gigantescos; então, ele não pode mais evitar a questão: Tem a história um sentido?  A história da salvação não nega os obstáculos mas os enfrenta com esperança, com aquela esperança que não delude. Este esboço preliminar da maneira como, para a fé cristã, a verdade da redenção ilumina a condição humana deve ser complementado por uma avaliação de como o próprio homem vê, hoje em dia, sua situação histórica efetiva.

Não podemos perder de vista também que o sofrimento pode ser uma “escola”. Num dos tópicos da Spe Salvi (n. 35-40), o Papa Bento XVI aborda o seguinte tema: Agir e sofrer como lugares de aprendizagem da esperança. Podemos falar então de uma dimensão “pedagógica” do sofrimento, ou de ver como nos posicionamos diante dele. O Papa nos diz que “A grandeza da humanidade determina-se essencialmente na relação com o sofrimento e com quem sofre. Isto vale tanto para o indivíduo como para a sociedade. Uma sociedade que não consegue aceitar os que sofrem e não é capaz de contribuir, mediante a compaixão, para fazer com que o sofrimento seja compartilhado e assumido mesmo interiormente é uma sociedade cruel e desumana”. E ainda: “sofrer com o outro, pelos outros; sofrer por amor da verdade e da justiça; sofrer por causa do amor e para se tornar uma pessoa que ama verdadeiramente: estes são elementos fundamentais de humanidade, o seu abandono destruiria o mesmo homem”. E quando se pergunta sobre a resposta de Deus ao problema do mal, fé cristã, pela revelação nos mostrou que Deus – a Verdade e o Amor em pessoa – quis sofrer por nós e conosco. E, neste sentido, cita Bernardo de Claraval: Deus não pode padecer, mas pode-se compadecer. Essa paixão de Deus pela e com a humanidade, só pode se originar do seu amor sem limites: “o homem tem para Deus um valor tão grande que Ele mesmo Se fez homem para poder padecer com o homem, de modo muito real, na carne e no sangue, como nos é demonstrado na narração da Paixão de Jesus”. Por isso a cruz é a resposta de Deus ao sofrimento humano, pois “a partir de lá entrou em todo o sofrimento humano alguém que partilha o sofrimento e a sua suportação; a partir de lá se propaga em todo o sofrimento a consolatio, a consolação do amor solidário de Deus, surgindo assim a estrela da esperança”. Neste sentido em Jesus, Deus mesmo se tornou nossa grande “Esperança”.

Cristo é o Redentor da humanidade. Deste modo a redenção é um processo que envolve tanto a divindade quanto a humanidade de Cristo. Se ele não fosse divino, não poderia pronunciar o julgamento de perdão efetivo de Deus, nem poderia ter parte na vida Trinitária interior de Deus. Mas, se não fosse homem, Jesus Cristo não poderia fazer a reparação em nome da humanidade pelos pecados cometidos por Adão e seus descendentes. Somente por ter as duas naturezas é que ele pôde ser a cabeça representante que oferece satisfação por todos os pecadores e a eles confere a graça.

É preciso lembrar também que toda obra da Redenção é fruto da ação trinitária, pois como uma obra ad extra de Deus, a redenção é atribuível a todas as três pessoas divinas, mas é atribuída a cada uma delas em diferentes aspectos. A iniciativa pela qual o Filho e o Espírito Santo são enviados ao mundo é atribuída ao Pai, a fonte original de quem fluem todas as bênçãos. O Filho, na medida em que se torna encarnado e morre na Cruz, produz a reversão pela qual somos transformados da inimizade para a amizade com Deus. O Espírito Santo, enviado para a mente e o coração dos fiéis, permite-lhes participar pessoalmente dos benefícios da ação redentora de Deus. Depois da Ascensão de Cristo, o Espírito Santo torna presentes os frutos da atividade redentora de Cristo na Igreja e por meio dela..

 

A questão do pecado e as perspectivas atuais de reflexão.

 

Após o Concílio Vaticano II, foram elaboradas diversas abordagens teológicas sobre o pecado original. Antes de analisá-las, é importante salientarmos que a teologia tradicional faz uma distinção entre o pecado original originante e o pecado original originado.O pecado original originante refere-se ao pecado cometido no início da história da humanidade, que gerou o mal que recaiu sobre o mundo. Já o pecado original originado constitui o desdobramento daquele pecado em consequências negativas, que se expressam em um isolamento do ser humano com relação a Deus. Diversos teólogos desenvolveram análises desses dois pressupostos fundamentais com base em matrizes diferenciadas, buscando identificar algumas dimensões essenciais.

A primeira delas é a dimensão ontológica - abordada anteriormente nesta obra -, a qual refere à concepção de que o pecado original é algo inerente à natureza humana. Nessa dimensão, o critério de historicidade não pode ser desconsiderado - o que não significa a contestação da existência de Adão. Como já mencionado, essa dimensão evidencia que as narrativas bíblicas sobre a Criação tinham como intenção a educação religiosa do povo de Israel. Assim, Adão, mais que um homem com subjetividade constituída, representa uma personalidade coletiva, o primeiro pai que transmitiu a todos os seus descendentes o estado de pecado. A segunda dimensão de análise é a sociológica. Nela, o pecado original é abordado como o pecado do mundo. Os teólogos que defendem a pregação de Jesus sobre o amor ao próximo acreditam que o pecado está relacionado com a “recusa de uma abertura para os outros, primeiro para Deus e depois para o próximo”. Dessa maneira, mesmo sendo entendido em um nível pessoal, o pecado permeia as interações humanas e as diversas estruturas e instituições sociais: “cada pessoa está objetivamente dentro de uma situação de pecado, uma espécie de atmosfera contaminada, preexistente a cada pessoa concreta, influenciando-a, contudo, e levando-a ao pecado”. Há ainda uma terceira abordagem, que analisa a doutrina do pecado original sob o viés da perspectiva histórico-salvífica. Nela, enfatiza-se Cristo como o modelo de todos os seres humanos. Fundamentada na lógica Criação-Encarnação-Redenção, essa dimensão permite compreender o status teleológico da Economia da Salvação. Destarte, quando os seres humanos nascem, não nascem apenas na situação de pecado, mas também numa situação de redenção. Por isto mesmo, numa perspectiva cristã “não tem sentido falar de não salvação desvinculada da salvação decorrente da graça de Cristo (tema da disciplina da Doutrina da Graça). Situação de não salvação e situação de salvação constituem a condição humana real e histórica.

Por fim, há a dimensão existencial. A preocupação dos teólogos que defendem essa posição é esclarecer o significado subjetivo e pessoal da Revelação: “ isa descobrir o sentido de que se reveste para mim a Palavra [...], que é considerada como uma interpelação dirigida diretamente ao indivíduo ao qual ela abre sua realidade tal como é vista por Deus, e solicita e provoca conversão” .  Destacamos que, por causa da desobediência de Adão, o pecado afetou toda a humanidade, distanciando-a do Criador. Contudo, pela graça de Deus, a Salvação foi oferecida à humanidade por meio de Cristo. A graça, portanto, constitui o elemento fundamental do plano salvífico de Deus. Assim, é importante dizer que o tratado da graça é ligado a este tema, nele analisaremos a doutrina da graça e seus desdobramentos diante da finitude humana. Ali apresentaremos a teologia da graça presente nas Sagradas Escrituras e na Tradição, a fim de esclarecer como ocorre o processo de experiência da graça.

 

REFERÊNCIAS

ANDRADE, B. Pecado original ou graça do perdão? São Paulo: Paulus, 2007.

DE CARDEDAL, O. G. Cristología. Manuales Sapientia Fidei, nº 24, Madrid, 2001.

DE LA PEÑA, J. L. O Dom de Deus. Antropologia Teológica. São Paulo: Loyola, 1997.

HILBERATH, B. J. Doutrina da graça. In: Schneider, T. Manual de dogmática (II). Petrópolis, Vozes, 2001.

LADARIA, L. F. Introdução à Antropologia Teológica. São Paulo: Loyola, 1998.

MIRANDA, M. F. A salvação de Jesus Cristo. A doutrina da graça. São Paulo: Loyola, 2004.

MONDIN, B. Antropologia Teológica. História, problemas, perspectivas. São Paulo: Paulinas, 1986.

RANHER, K. Curso fundamental da fé. São Paulo: Paulinas, 1989.

 

Fernando Vanini de Maria

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